quinta-feira, 31 de março de 2011

Preparar a Páscoa do Senhor

“Vamos nos Preparar para a Páscoa do Senhor – Do Domingo de Ramos ao Domingo da Ressurreição”

No Domingo de Ramos, todas as comunidades cristãs do Brasil iniciam as grandes celebrações da Semana Santa.  É muito importante resgatar o verdadeiro sentido da entrada de Jesus em Jerusalém, para que celebremos a festa com mais profundidade.  Mt 21,5  nos dá uma dica, quando cita o profeta Zacarias.  Pois Jesus, estava fazendo uma releitura de Zacarias 9, 9-10.  O profeta vivia numa situação de grande opressão e pobreza, e procura animar o seu povo a manter viva a chama de resistência através da esperança na chegada de um Messias, que teria três grandes características: seria rei (9, 9-10), bom pastor (11,4-17) e “transpassado”(12, 9-14).  Portanto, quando Jesus, com os seus discípulos, fez a sua entrada em Jerusalém, era uma maneira forte de proclamar a chegada do Messias, do Rei esperado pelos pobres de Javé.
Jesus era bem diferente dos reis de então.  Estes faziam questão de apresentar-se com toda a pompa, montados sobre cavalos imponentes, mas o rei previsto por Zacarias entraria em Jerusalém montado num jumento – o animal do pequeno agricultor.  O seu reino seria, não de dominação, opulência e opressão, mas de paz, de justiça e de solidariedade: “Dance de alegria, cidade de Sião; grite de alegria, cidade de Jerusalém, pois agora o seu rei está chegando, justo e vitorioso. Ele é pobre, vem montado num jumento, num jumentinho, filho duma jumenta. Ele destruirá os carros de guerra de Efraim e os cavalos de Jerusalém; quebrará o arco de guerra. Anunciará a paz a todas as nações, e o seu domínio irá de mar a mar” (Zc 9,9).
A entrada de Jesus em Jerusalém era uma entrada triunfal – do triunfo de Deus, do Messias dos pobres e justos, e uma viravolta nos valores da sociedade.  Era a rejeição dos valores opressores dos reinos mundanos, e celebração de Javé, o libertador, que “ouve o clamor dos pobres e sofridos” (cf Ex 3,7).  Celebrar a memória deste evento no Domingo de Ramos deve nos levar a um cumpromisso maior com a construção de um mundo de paz verdadeira, fruto de justiça, partilha e solidariedade.  Quando falamos da entrada triunfal, lembremo-nos que é o triunfo da fraqueza de Deus, da Cruz, do projeto do Reino, pois como disse Paulo, “a loucura de Deus é mais sábia do que os homens e a fraqueza de Deus é mais forte do que os homens”(I Cor 1,25).  Cuidemos de não transformar a celebração litúrgica num folclore, glorificando o poder e a dominação, pois, conforme o hino, “Queriam um grande Rei que fosse forte, dominador e por isso não creram nele e mataram o Salvador”.  Evitemos criar uma caricatura de Jesus como Rei poderoso, conforme os padrões da nossa sociedade, e  recuperemos a finalidade da ação profética de Jesus – reacender a esperança dos excluídos, marginalizados, pobres e oprimidos, assumindo cada vez mais ações concretas na busca da construção do Reino de Deus.
O ponto alto do Ano Litúrgico é o Tríduo Pascal.  Aqui está resumido todo o mistério da nossa salvação, pela vida, morte e ressurreição de Jesus.  Na quinta à noite comemoramos a Ceia que resumiu toda a vida de Jesus.  “Tendo amado os seus, amou-os até o extremo”  (Jo 13,1) - até o último ponto de doação, dando a sua vida.  Jesus nos deu o mandamento que deve nortear toda a nossa vida – “façam isso em memória de mim!”.  Não fazendo uma lembrança de algo que já passou, mas o memorial – tornando presente tudo que foi celebrado nessa ceia derradeira, e comprometendo-nos com o seguimento de Jesus hoje, alimentados por seu corpo e sangue, numa vida de amor e solidariedade.
Há uma ligação estreita entre todos os elementos do Tríduo, pois sexta feira foi a consequencia lógica da vida de Jesus.  Ele não veio para morrer, mas para que “todos tenham a vida e a vida em abundância” (Jo 10,10).  Por isso, o seu projeto do Reino bateu frontalamente com os projetos de dominação do seu tempo, e por isso, ele foi assassinado.  Fiel até o fim, assumiu as consequências da fidelidade à vontade do Pai, e foi morto, e morto na Cruz.  Desvinculado da Quinta-feira Santa e do Sábado Santo, Sexta-feira seria a celebração de uma derrota fragorosa.  Por isso, depois de sentirmos a dor e a tristeza da sexta feira, aparente vitória do mal, celebramos numa explosão de alegria a vitória de Deus, do bem, na ressurreição de Jesus, garantia da nossa, através da Liturgia Pascal.
Nos relatos dos Evangelhos certos elementos são comuns: o fato que o túmulo era vazio, que as primeiras testemunhas eram as mulheres, e que uma delas era Maria Madalena.  Um fato salta aos olhos – ninguém esperava a Ressurreição.  A Cruz era o fim da esperança, a maior desilusão possível.  Se somarmos a isso o fato que todos eles traíram Jesus (ou por dinheiro, ou por covardia), podemos imaginar o ambiente pesado entre os discípulos na manhã do Domingo.  Nisso, chegam a Maria e as mulheres com a notícia do  túmulo vazio.  Pedro e o Discípulo Amado correm até o túmulo. Enquanto Pedro vê sem acreditar, o Discípulo Amado acredita.  Só quem olha com os olhos do amor, penetra além das aparências!
Como na historia dos discípulos de Emaús, os textos demonstram que a nossa fé não está baseada num túmulo vazio! É a experiência da presença de Jesus Ressuscitado que explica porque o túmulo está vazio! Quando olhamos para o mundo ao nosso redor, é fácil não acreditar na vitória da vida sobre a morte.  Há tanto sofrimento e injustiça, que só uma experiência profunda da presença de Jesus libertador no meio da comunidade poderá nos sustentar na luta por um mundo melhor, com fé na vitória final do bem sobre o mal, da luz sobre as trevas, da graça sobre o pecado!  Nós todos somos discípulos amados, pois “nada nos separa do amor e Deus em Jesus Cristo” (cf. Rm 8), mas será que somos discípulos amantes? Será que amamos a Jesus e ao próximo? Lembremo-nos que o amor proposto pelo evangelho não é um sentimento, mas uma atitude de vida, de solidariedade, de partilha, de justiça. “O amor consiste no seguinte: não fomos nós que amamos a Deus, mas foi ele que nos amou, e nos enviou o seu Filho como vítima expiatória por nossos pecados. Se Deus nos amou a tal ponto, também nós devemos amar-nos uns aos outros” (I Jo 4,10-11).
Sigamos os passos da Semana Santa, fazendo “memorial”.  Vejamos a semana na sua integridade – o gesto profético do Domingo de Ramos, a Ceia do amor, que é ao mesmo tempo a Última Ceia (pois marca o fim de uma presença física de Jesus entre os discípulos) e a Ceia do Senhor (pois instaura uma nova maneira da sua presença, através da Eucaristia), a conseqüência de Jesus ter sido fiel até o fim, na Sexta Feira Santa, e a grande vitória do bem sobre o mal, da vida sobre a morte, de Deus sobre o Maligno, na Vigília Pascal e no Domingo de Páscoa. Que a mensagem da Ressurreição nos anime e dê força, especialmente quando a Cruz pesar muito em nossas vidas.

Pe. Tomaz Hughes SVD
e-mail: thughes@netpar.com.br

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