quinta-feira, 15 de junho de 2017

Corpus-Christi

 

Solenidade do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo
(Corpus Christi)

Jo 6,51-58

"Este é o pão que desceu do céu"


Oração do dia

Senhor Jesus Cristo, neste admirável sacramento, nos deixastes o memorial da vossa paixão. Dai-nos venerar com tão grande amor o mistério do vosso Corpo e do vosso Sangue, que possamos colher continuamente os frutos da vossa redenção. Vós, que sois Deus com o Pai, na unidade do Espírito Santo.

Evangelho (João 6,51-58)

Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo Lucas.
Naquele tempo, disse Jesus às multidões dos judeus: 6 51 "Eu sou o pão vivo que desceu do céu. Quem comer deste pão viverá eternamente. E o pão, que eu hei de dar, é a minha carne para a salvação do mundo".
52 A essas palavras, os judeus começaram a discutir, dizendo: "Como pode este homem dar-nos de comer a sua carne?"
53 Então Jesus lhes disse: "Em verdade, em verdade vos digo: se não comerdes a carne do Filho do Homem, e não beberdes o seu sangue, não tereis a vida em vós mesmos.
54 Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna; e eu o ressuscitarei no último dia.
55 Pois a minha carne é verdadeiramente uma comida e o meu sangue, verdadeiramente uma bebida.
56 Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele.
57 Assim como o Pai que me enviou vive, e eu vivo pelo Pai, assim também aquele que comer a minha carne viverá por mim.
58 Este é o pão que desceu do céu. Não como o maná que vossos pais comeram e morreram. Quem come deste pão viverá eternamente".
Palavra da Salvação.

COMENTÁRIO

Homilia de Bento XVI para a Solenidade do Corpo de Deus em 2008

Depois do tempo forte do ano litúrgico, que centrando-se sobre a Páscoa se prolonga por três meses primeiro os quarenta dias da Quaresma, depois os cinquenta dias do Tempo pascal a liturgia faz-nos celebrar três festas que ao contrário têm um carácter “sintético”: a Santíssima Trindade, depois o Corpus Christi, e por fim o Sagrado Coração de Jesus. Qual é exatamente o significado da solenidade de hoje, do Corpo e do Sangue de Cristo? A própria celebração que estamos a realizar no-lo diz, no desenvolvimento dos gestos fundamentais: antes de tudo reunimo-nos em volta do altar do Senhor, para estar na sua presença; em segundo lugar faremos a procissão, isto é, o caminhar com o Senhor; e por fim, o ajoelharmo-nos diante do Senhor, a adoração, que já inicia na Missa e acompanha toda a procissão, mas tem o seu ápice no momento final da bênção eucarística, quando todos nos prostraremos diante d’Aquele que se inclinou até nós e deu a vida por nós. Detenhamo-nos brevemente sobre estas três atitudes, para que sejam verdadeiramente expressão da nossa fé e da nossa vida.
Portanto, o primeiro ato é o de reunir-se na presença do Senhor. É o que antigamente se chamava “statio”. Imaginemos por um momento que em toda a cidade de Roma haja só este único altar, e que todos os cristãos da cidade sejam convidados a reunir-se aqui, para celebrar o Salvador morto e ressuscitado. Isto dá-nos a ideia daquilo que foi, nas origens, a celebração eucarística em Roma, e em muitas outras cidades onde chegava a mensagem evangélica: havia em cada Igreja particular um só Bispo e à sua volta, em volta da Eucaristia por ele celebrada, constituía-se a Comunidade, única porque era uno o Cálice abençoado e um o Pão partido, como ouvimos das palavras do apóstolo Paulo na segunda Leitura (cf. 1 Cor 10, 16-17). Vem à mente a outra célebre expressão paulina: “Não há judeu nem grego; não há servo nem livre, não há homem nem mulher, pois todos vós sois um só em Cristo” (Gl 3, 28). “Todos vós sois um só”! Sente-se nestas palavras a verdade e a força da revolução cristã, a revolução mais profunda da história humana, que se experimenta precisamente em volta da Eucaristia: reúnem-se aqui na presença do Senhor pessoas diversas por idade, sexo, condição social, ideias políticas. A Eucaristia nunca pode ser um facto privado, reservado a pessoas que se escolheram por afinidades ou por amizade. A Eucaristia é um culto público, que nada tem de esotérico, de exclusivo. Também aqui, esta tarde, não fomos nós que escolhemos com quem nos encontrarmos, viemos e encontramo-nos uns ao lado dos outros, irmanados pela fé e chamados a tornarmo-nos um único corpo partilhando o único Pão que é Cristo. Estamos unidos independentemente das nossas diferenças de nacionalidade, de profissão, de camada social, de ideias políticas: abrimo-nos uns aos outros para nos tornarmos um só a partir d’Ele. Foi esta, desde os inícios, uma característica do cristianismo realizada visivelmente em volta da Eucaristia, e é necessário vigiar sempre para que as tentações frequentes de individualismo, mesmo se em boa fé, de facto não vão em sentido oposto. Portanto, o Corpus Christi recorda-nos antes de tudo isto: que ser cristãos significa reunir-se de todas as partes para estar na presença do único Senhor e tornar-se n’Ele um só.
O segundo aspeto constitutivo é o caminhar com o Senhor. É a realidade manifestada pela procissão, que viveremos juntos depois da Santa Missa, quase como um seu prolongamento natural, movendo-nos atrás d’Aquele que é a Via, o Caminho. Com a doação de Si mesmo na Eucaristia, o Senhor Jesus liberta-nos das nossas “parálises”, faz-nos levantar e faz-nos “proceder”, isto é, faz-nos dar um passo em frente, e depois outro, e assim põe-nos a caminho, com a força deste Pão da vida. Como aconteceu ao profeta Elias, que se tinha refugiado no deserto por receio dos seus inimigos, e tinha decidido deixar-se morrer (cf. 1 Rs 19, 1-4). Mas Deus despertou-o do sono e fez-lhe encontrar ao lado um pão cozido: “Levanta-te e come disse-lhe porque ainda tens um caminho longo a percorrer” (1 Rs 19, 5.7). A procissão do Corpus Christi ensina-nos que a Eucaristia nos quer libertar de qualquer abatimento e desencorajamento, quer fazer-nos levantar, para que possamos retomar o caminho com a força que Deus nos dá mediante Jesus Cristo. É a experiência do povo de Israel no êxodo do Egito, a longa peregrinação através do deserto, da qual nos falou a primeira Leitura. Uma experiência que para Israel é constitutiva, mas resulta exemplar para toda a humanidade. De facto, a expressão “nem só de pão vive o homem, mas… de tudo o que sai da boca do Senhor” (Dt 8, 3) é uma afirmação universal, que se refere a todos os homens enquanto homens. Cada um pode encontrar o próprio caminho, se encontrar Aquele que é Palavra e Pão de vida e se deixar guiar pela sua presença amiga. Sem o Deus-conosco, o Deus próximo, como podemos enfrentar a peregrinação da existência, quer individualmente quer em comunidade e família de povos? A Eucaristia é o Sacramento do Deus que não nos deixa sozinhos no caminho, mas se coloca ao nosso lado e nos indica a direção. De facto, não é suficiente ir em frente, é preciso ver para onde se vai! Não é suficiente o “progresso”, se não há critérios de referência. Aliás, se se andar fora do caminho, corre-se o risco de cair num precipício, ou contudo de se afastar mais rapidamente da meta. Deus criou-nos livres, mas não nos deixou sozinhos: Ele mesmo se fez “via” e veio caminhar juntamente conosco, para que a nossa liberdade tenha também o critério para discernir o caminho justo e percorrê-lo.
E a este ponto não se pode deixar de pensar no início do “decálogo”, os dez mandamentos, onde está escrito: “Eu sou o Senhor, teu Deus, que te fez sair do Egito, de uma casa de escravidão. Não terás outro Deus além de Mim” (Êx 20, 2-3). Encontramos aqui o sentido do terceiro elemento constitutivo do Corpus Christi: ajoelhar-se em adoração diante do Senhor. Adorar o Deus de Jesus Cristo, que se fez pão repartido por amor, é o remédio mais válido e radical contra as idolatrias de ontem e de hoje. Ajoelhar-se diante da Eucaristia é profissão de liberdade: quem se inclina a Jesus não pode e não deve prostrar-se diante de nenhum poder terreno, mesmo que seja forte. Nós, cristãos, só nos ajoelhamos diante do Santíssimo Sacramento, porque nele sabemos e acreditamos que está presente o único Deus verdadeiro, que criou o mundo e o amou de tal modo que lhe deu o seu Filho único (cf. Jo 3, 16). Prostramo-nos diante de um Deus que foi o primeiro a inclinar-se diante do homem, como Bom Samaritano, para o socorrer e dar a vida, e ajoelhou-se diante de nós para lavar os nossos pés sujos. Adorar o Corpo de Cristo significa crer que ali, naquele pedaço de pão, está realmente Cristo, que dá sentido verdadeiro à vida, ao imenso universo como à menor criatura, a toda a história humana e à existência mais breve. A adoração é a oração que prolonga a celebração e a comunhão eucarística na qual a alma continua a alimentar-se: alimenta-se de amor, de verdade, de paz; alimenta-nos de esperança, porque Aquele diante do qual nos prostramos não nos julga, não nos esmaga, mas liberta-nos e transforma-nos.
Eis por que reunir-nos, caminhar, adorar nos enche de alegria. Fazendo nossa a atitude adorante de Maria, que neste mês de Maio recordamos de modo particular, rezemos por nós e por todos; rezemos por todas as pessoas que vivem nesta cidade, para que Te possam conhecer, ó Pai, e Àquele que Tu enviaste, Jesus Cristo. E desta forma ter a vida em abundância. Amém.


Salmo 147/147B

Glorifica o Senhor, Jerusalém;
celebra teu Deus, ó Sião! 

Glorifica o Senhor, Jerusalém!
Ó Sião, canta louvores ao teu Deus!
Pois reforçou com segurança as tuas portas,
e os teus filhos em teu seio abençoou.

Glorifica o Senhor, Jerusalém;
celebra teu Deus, ó Sião! 

A paz em teus limites garantiu
e te dá como alimento a flor do trigo.
Ele envia suas ordens para a terra,
e a palavra que ele diz corre veloz.

Glorifica o Senhor, Jerusalém;
celebra teu Deus, ó Sião! 

Anuncia a Jacó sua palavra,
seus preceitos e suas leis a Israel.
Nenhum povo recebeu tanto carinho,
a nenhum outro revelou os seus preceitos.

Glorifica o Senhor, Jerusalém;
celebra teu Deus, ó Sião! 



domingo, 20 de março de 2016

DOMINGO DE RAMOS - Ano C


Refletindo o Evangelho do Domingo

Pe. Thomaz Hughes, SVD

DOMINGO DE RAMOS - Ano C



Lc 19,28-40

Bendito aquele que vem em nome do Senhor!



Oração do dia

Deus eterno e todo-poderoso, para dar aos homens um exemplo de humildade, quisestes que o nosso salvador se fizesse homem e morresse na cruz. Concedei-nos aprender o ensinamento da sua paixão e ressuscitar com ele em sua glória. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, Vosso Filho, na unidade do Espírito Santo.

Evangelho - Procissão - Lc 19,28-40

+ Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo Lucas 19,28-40
Naquele tempo:
 28Jesus caminhava à frente dos discípulos,
 subindo para Jerusalém.
 29Quando se aproximou de Betfagé e Betânia,
 perto do monte chamado das Oliveiras,
 enviou dois de seus discípulos, dizendo:
 30'Ide ao povoado ali na frente.
 Logo na entrada encontrareis um jumentinho amarrado,
 que nunca foi montado.
 Desamarrai-o e trazei-o aqui. 
31Se alguém, por acaso, vos perguntar:
 'Por que desamarrais o jumentinho?', 
respondereis assim: 'O Senhor precisa dele'. 
32Os enviados partiram e encontraram tudo
exatamente como Jesus lhes havia dito.
 33Quando desamarravam o jumentinho,
 os donos perguntaram:
 'Por que estais desamarrando o jumentinho?'
 34Eles responderam: 'O Senhor precisa dele.'
35E levaram o jumentinho a Jesus.
 Então puseram seus mantos sobre o animal
e ajudaram Jesus a montar.
 36E enquanto Jesus passava,
 o povo ia estendendo suas roupas no caminho.
 37Quando chegou perto da descida do monte das Oliveiras,
 a multidão dos discípulos, 
aos gritos e cheia de alegria,
começou a louvar a Deus
 por todos os milagres que tinha visto.
 38Todos gritavam:
 'Bendito o Rei, que vem em nome do Senhor!
 Paz no céu e glória nas alturas!'
 39Do meio da multidão, alguns dos fariseus
 disseram a Jesus:
 'Mestre, repreende teus discípulos!'
 40Jesus, porém, respondeu: 'Eu vos declaro:
 se eles se calarem, as pedras gritarão.' Palavra da Salvação.

COMENTÁRIO

Quase não há comunidade católica no Brasil que não comemore hoje, com muita alegria, a entrada de Jesus em Jerusalém. São organizadas procissões, o povo abana ramos, se celebram encenações do evento. Pessoas que dificilmente pisam em uma igreja nos domingos comuns, hoje fazem questão de não perder a procissão. Porém, para não reduzirmos a comemoração a mero folclore, é importante estudar o que significava este evento para Jesus, e para o evangelista.
Dificulta o nosso entendimento da passagem a nossa pouca familiaridade com o Antigo Testamento. Cumpre relembrar um trecho do profeta Zacarias: “Dance de alegria, cidade de Sião; grite de alegria, cidade de Jerusalém, pois agora o seu rei está chegando, justo e vitorioso. Ele é pobre, vem montado num jumento, num jumentinho, filho duma jumenta... Anunciará a paz a todas as nações, e o seu domínio irá de mar a mar, do rio Eufrates até os confins da terra” (Zc 9, 9-10). Esse era um trecho muito importante na espiritualidade do “pobres de Javé”, que esperavam a chegada do Messias libertador. Nessa esperança situam-se Maria e José e os discípulos de Jesus. Foi dentro desta espiritualidade que Jesus foi criado. Zacarias traçava as características do messias - seria um rei, “justo e pobre”, não de guerra, mas de paz! Viria estabelecer uma sociedade diferente da sociedade opressora do tempo de Zacarias (e de Jesus, e de nós) - onde os poderosos e violentos oprimiam os pobres e pacíficos! Seria uma sociedade onde, entre outros elementos, a economia estaria a serviço da vida, onde todos cuidariam da “casa comum”, o planeta! Um rei jamais entraria em uma cidade montado em um jumento - o animal do pobre camponês, mas um cavalo branco de raça! Jesus, fazendo a sua entrada assim, faz uma releitura de Zacarias, e se identificou com o rei pobre, da paz, da esperança dos pobres e oprimidos!
Por isso, muitas vezes perdemos totalmente o sentido da entrada de Jesus em Jerusalém. Celebramos o evento como se fosse a entrada de um governante do Império romano – ou dos impérios dos nossos tempos - com pompa, imponência, e demonstração de poder e força. O contrário do que Jesus fez! Chamamos o evento da “entrada triunfal de Jesus” - e realmente foi, mas como triunfo de Deus, que se encarnou entre nós como Servo! Nada mais longe do sentido original desse evento do que manifestações de poderio e pompa, mesmo - ou especialmente - quando feitas em nome da Igreja e do Evangelho de Jesus!
O texto convida a todos nós a revermos as nossas atitudes. Seguimos Jesus - mas será que é o Jesus real, o Jesus de Nazaré, o Jesus rei dos pobres e humildes, o Jesus cumpridor da profecia de Zacarias? Ou inventamos outro Jesus - poderoso nos moldes da nossa sociedade, com força, poder e prestígio, conforme o mundo entende esses termos? Essa semana foi o ponto culminante de toda a vida e missão de Jesus - das suas opções concretas em favor dos oprimidos, do seu desafio à religião oficial que escondia o verdadeiro rosto de Deus, das consequências políticas e econômicas da sua proposta de uma sociedade justa e igualitária, manifestação concreta da chegada do Reino de Deus. Tudo isso levou os poderosos, romanos e judeus, a tramarem a sua morte. É importante lembrar que a paixão e morte de Jesus foram consequência da sua vida - é impossível entender o que significa a Semana Santa sem ligá-la com o resto da vida de Jesus e com a sua proposta para a sociedade e para os seus seguidores. Jesus não morreu - foi morto porque incomodava, como continua a incomodar ainda hoje os que continuam com o sistema opressor que é a expressão do anti-Reino, mesmo quando disfarçado com discurso religioso, como se fazia no Templo.
Um canto usado nas celebrações de hoje nos alerta: “Eles queriam um grande rei, que fosse forte, dominador. E por isso não creram n’Ele e mataram o salvador!” Realmente acreditamos no rei dos pobres e oprimidos, da paz e da solidariedade, da misericórdia e compaixão, ou só fazemos um folclore no Dia de Ramos, bonito, mas totalmente desvinculado da mensagem verídica e profunda do profeta Zacarias e do Evangelho de hoje?

Salmo responsorial 21/22

Meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes?

Riem de mim todos aqueles que me vêem,
torcem os lábios e sacodem a cabeça:
“Ao Senhor se confiou, ele o liberte
e agora o salve, se é verdade que ele o ama!”

Meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes?

Cães numerosos me rodeiam furiosos,
e por um bando de malvados fui cercado.
Transpassaram minhas mãos e os meus pés
e eu posso contar todos os meus ossos.

Meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes?

Eles repartem entre si as minhas vestes
e sorteiam entre si a minha túnica.
Vós, porém, ó meu Senhor, não fiqueis longe,
ó minha força, vinde longo em meu socorro!

Meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes?

Anunciarei o vosso nome a meus irmãos
e no meio da assembléia hei de louvar-vos!
Vós que temeis ao Senhor Deus, dai-lhe louvores,
glorificai-o, descendentes de Jacó,
e respeitai-o, toda a raça de Israel!

Meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes?



sexta-feira, 11 de março de 2016

5º DOMINGO DA QUARESMA - Ano C


Refletindo o Evangelho do Domingo

Pe. Thomaz Hughes, SVD

QUINTO DOMINGO DA QUARESMA - Ano C



Jo 8, 1-11

“Quem não tiver pecado, atire nela a primeira pedra”



Oração do dia

Senhor nosso Deus, dai-nos, por vossa graça, caminhar com alegria na mesma caridade que levou o vosso Filho a entregar-se à morte no seu amor pelo mundo. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, Vosso Filho, na unidade do Espírito Santo.

Evangelho (João 8,1-11)

Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo João.
8,1 Dirigiu-se Jesus para o monte das Oliveiras.
2 Ao romper da manhã, voltou ao templo e todo o povo veio a ele. Assentou-se e começou a ensinar.
3 Os escribas e os fariseus trouxeram-lhe uma mulher que fora apanhada em adultério.
4 Puseram-na no meio da multidão e disseram a Jesus: “Mestre, agora mesmo esta mulher foi apanhada em adultério.
5 Moisés mandou-nos na lei que apedrejássemos tais mulheres. Que dizes tu a isso?”
6 Perguntavam-lhe isso, a fim de pô-lo à prova e poderem acusá-lo. Jesus, porém, se inclinou para a frente e escrevia com o dedo na terra.
7 Como eles insistissem, ergueu-se e disse-lhes: “Quem de vós estiver sem pecado, seja o primeiro a lhe atirar uma pedra”.
8 Inclinando-se novamente, escrevia na terra.
9 A essas palavras, sentindo-se acusados pela sua própria consciência, eles se foram retirando um por um, até o último, a começar pelos mais idosos, de sorte que Jesus ficou sozinho, com a mulher diante dele.
10 Então ele se ergueu e vendo ali apenas a mulher, perguntou-lhe: “Mulher, onde estão os que te acusavam? Ninguém te condenou?”
11 Respondeu ela: “Ninguém, Senhor”. Disse-lhe então Jesus: “Nem eu te condeno. Vai e não tornes a pecar”.
Palavra da Salvação.

Comentário ao Evangelho

Essa história parece muito mais semelhante às narrativas do Evangelho de Lucas do que do Evangelho do Discípulo Amado. De fato, não aparece nos manuscritos mais antigos de João e só aparece pela primeira vez em versões do século terceiro. Por isso, a maioria dos estudiosos acha que originalmente esta história circulava nas comunidades como uma tradição independente. O copista que a inseriu talvez fizesse por achar que ilustrasse duas frases do Quarto Evangelho: “Eu julgo a ninguém” (Jo 8, 15) e “Quem de vocês pode me acusar de pecado?” (Jo 8, 46). O tema do perdão de uma mulher pecadora é tipicamente lucano. Alguns manuscritos situam esse texto no Evangelho de Lucas durante as controvérsias da Semana Santa - o que parece ser um contexto mais adequado.
O problema apresentado a Jesus pelos fariseus é semelhante àquele do imposto em Lc 21, 27-38. A Lei judaica prescreveu a pena de morte para uma mulher casada, pega em adultério (Dt 22, 23-24). Mas, segundo João 18, 31, os romanos tinham retirado dos judeus o direito de condenar alguém a morte. Portanto, se Jesus dissesse que ela deveria ser apedrejada, ele contrariaria a lei civil dos romanos; se ele negasse esta pena, estaria contra a lei religiosa mosaica. É uma cilada semelhante ao dilema sobre o imposto a César em Mc 12 13-17, ou a questão sobre o divórcio em Mt 19, 3-9. Que os seus interlocutores não se interessam pela Lei se manifesta pelo fato de só acusarem a mulher e não o seu parceiro! Uma atitude machista tão comum ainda na nossa sociedade.
Não se esclarece o que foi que Jesus escreveu no chão. Alguns autores vêem uma referência a uma frase em Jeremias: “Aqueles que se afastam de ti terão seus nomes inscritos na poeira, porque abandonaram Javé, a fonte de água viva” (Jr 17,13). Assim seria uma indicação que os verdadeiros culpados são aqueles que se davam o direito de condenar a mulher.
Perguntando da mulher se os seus acusadores não a tinham condenado, Jesus deixa claro que ele não se identifica com eles. Ele não veio para condenar, mas para salvar! Por isso a mulher está livre para ir - mas não para pecar de novo!
O texto ilustra mais uma vez o recado central que vimos no evangelho do último Domingo - Deus é um Deus de misericórdia, e não de condenação. Ele condena o pecado, o mal, mas não a pessoa. Como em Lucas 15, 1-2 também no texto de hoje as pessoas que mais deviam se preocupar em manifestar o rosto misericordioso do Pai, se preocupavam mais em condenar, a partir de um legalismo que desconhecia a misericórdia. Jesus, do outro lado, valoriza a Lei (pede que a mulher não continue a pecar) mas tem compaixão diante da fraqueza humana. Aliás é notável que, nos Evangelhos, Jesus nunca é duro ou rígido com as pessoas que manifestam nas suas vidas sinais da fraqueza humana, mas é contundente com os que não têm compaixão nem misericórdia e que escondem o verdadeiro rosto de Deus através do seu legalismo e auto-suficiência.
Quantas vezes nas Igrejas - até hoje - se manifesta muito mais a dureza de uma mentalidade legalista do que a compaixão de um Deus que é “rico em misericórdia?”. Neste tempo quaresmal preocupemo-nos em sermos manifestação do Deus verdadeiro, misericordioso e compassivo, a exemplo de Jesus, que soube distinguir bem entre o pecado e o pecador. “Nem eu te condeno, vá e não peca mais!”

Salmo 125/126

Maravilhas fez conosco o Senhor,
exultemos de alegria!

Quando o Senhor reconduziu nossos cativos,
parecíamos sonhar;
encheu-se de sorriso nossa boca,
nossos lábios, de canções.

Maravilhas fez conosco o Senhor,
exultemos de alegria!

Entre os gentios se dizia: “Maravilhas
fez com eles o Senhor!”
Sim, maravilhas fez conosco o Senhor,
exultemos de alegria”

Maravilhas fez conosco o Senhor,
exultemos de alegria!

Mudai a nossa sorte, ó Senhor,
como torrentes no deserto.
os que lançam as sementes entre lágrimas
ceifarão com alegria.

Maravilhas fez conosco o Senhor,
exultemos de alegria!

Chorando de tristeza sairão,
espalhando suas sementes;
cantando de alegria voltarão,
carregando os seus feixes!

Maravilhas fez conosco o Senhor,
exultemos de alegria!