Refletindo o Evangelho do Domingo
Pe. Thomaz Hughes, SVD
NONO DOMINGO COMUM
Mt 7, 21-27
“Só entrará no Reino do Céu quem põe em prática a vontade do meu Pai”
O texto de hoje conclui o grande discurso da vida cristã que é o Sermão da Montanha. Depois de dar-nos as orientações para uma vida de seguimento e discipulado, Jesus termina insistindo na necessidade de a nossa fé nos levar à prática das obras do Reino de Deus. Não adianta uma fé que consiste somente em adesão intelectual às verdades sobre Jesus, pois é necessária uma fé que nos leve a construir a “justiça do Reino” na nossa sociedade. A Carta de Tiago vai retomar esse tema quando o autor escreve que “fé sem obras, é morta em si mesma” (Tg 2, 17).
O texto se divide em duas partes - a primeira, vv. 21-23, adverte contra uma religião, mesmo no nome do seguimento de Jesus, que não compromete com a luta em favor da justiça. Parece que na comunidade de Mateus, por volta do ano 90, havia uma tendência entre alguns de invocar o nome de Jesus, profetizar, fazer milagres, expulsar demônios, e ir atrás de manifestações extraordinárias do Espírito, sem que se comprometessem com a construção do Reino da Justiça. As palavras de Jesus para essas pessoas soam duras - chama-as de malfeitores, pois não se empenham na realização do projeto d’Ele, se vangloriam dos seus milagres e dons, que chamam a atenção, mas não brotam de uma vida de comprometimento com o Reino de Deus.
É atual esta advertência do texto, pois hoje em dia também muitas vezes existe a tendência de buscar uma religião de “sinais” e “milagres”, de manifestações aparentemente milagrosas do Espírito, mas que frequentemente esconde uma opção religiosa individualista e intimista, sem consequências para a construção da sociedade que Deus quer. Assim, a religião torna-se alienada e alienante em lugar de ser expressão de discípulos/as que são fermento na massa, sal da terra, luz do mundo.
A segunda parte do texto, vv. 24-27, usa uma imagem bastante comum na Palestina de Jesus - as enchentes repentinas que resultavam das chuvas torrenciais da época do inverno, e que causavam estragos nas vilas e roças. Uma imagem, aliás, muito fácil a compreender no Brasil do nosso tempo, visto a frequência de desastres ligadas à questão de inundações. Usa a imagem da construção de casas - uma feita com alicerce, outra sem. De fato, a falta de um alicerce firme não se faz sentir no tempo de bonança. As construções parecem igualmente sólidas. Mas, na tempestade, nas enxurradas e enchentes, logo se revela qual é a casa com alicerce, e qual carece de um fundamento sólido. É nessa hora que se revela tudo. Assim também com a vida cristã - enquanto tudo corre bem, não se manifesta a presença ou a falta do alicerce. Mas, quando batem as ventanias da vida, quando acontecem as enxurradas que ameaçam levar embora o que nós construímos, então se revela a presença ou a ausência de um alicerce. Isso pode acontecer no casamento, na vida religiosa e sacerdotal, no empenho pastoral. Enquanto tudo corre bem, não há problema. Porém, é só uma vida com fundamento forte que resistirá às pressões dos contratempos da caminhada! Mateus deixa bem claro o que deve ser o alicerce de uma vida cristã - Jesus e o seu projeto de vida, manifestado nas palavras do Sermão da Montanha. Uma vida cristã, uma vida missionária, uma vida religiosa construída sobre qualquer outro alicerce, está condenada a desmoronar. Paulo, mais tarde, advertirá a elite da comunidade de Corinto, tentada a substituir Jesus com a filosofia grega “que ninguém ponha outro fundamento a não ser aquele que já foi posto, Jesus Cristo” (1Cor 3, 11).
Portanto, somos convidados a fazer uma revisão honesta e sincera da nossa vida, em todos os sentidos. Qual é o alicerce sobre o que construo a minha vida - sobre algo movediço, que não resiste à prova do tempo e do desgaste diário, ou sobre o único alicerce que é rocha firme, inabalável e permanente - Jesus de Nazaré, e o seu projeto do Reino. A minha religião se baseia só no ouvir e no falar, ou me leva a um engajamento real para que o mundo se torne aquele que Deus sonha? O texto de hoje reforça uma outra frase lapidar do Sermão: “Se a justiça de vocês não for maior do que a dos escribas e fariseus, não entrarão no Reino dos Céus” (Mt 6, 20).
Fortaleçamos o alicerce da nossa vida cristã, fundamentando-a cada vez mais em Jesus e nas suas palavras, para que possa aguentar as enxurradas, enchentes e ventanias que a vida traz. Outro caminho é receita para o desastre!
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