domingo, 24 de abril de 2011

6° Domingo da Páscoa - Ano A



Refletindo o Evangelho do Domingo

Pe. Thomaz Hughes, SVD

SEXTO DOMINGO DA PÁSCOA - Ano A



Jo 14, 15-21

“Ele dará a vocês outro Advogado, para que permaneça com vocês para sempre”

Oração do dia
Deus eterno e todo-poderoso, dai-nos celebrar com fervor estes dias de júbilo em honra do Cristo ressuscitado, para que nossa vida corresponda sempre aos mistérios que recordamos. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, Vosso Filho, na unidade do Espírito Santo.

Evangelho - Jo 14,15-21

+ Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo João
Naquele tempo, disse Jesus a seus discípulos: 14,15Se me amais, guardareis os meus mandamentos, 16e eu rogarei ao Pai, e ele vos dará um outro Defensor, para que permaneça sempre convosco: 17o Espírito da Verdade, que o mundo não é capaz de receber, porque não o vê nem o conhece. Vós o conheceis, porque ele permanece junto de vós e estará dentro de vós. 18Não vos deixarei órfãos. Eu virei a vós. 19Pouco tempo ainda, e o mundo não mais me verá, mas vós me vereis, porque eu vivo e vós vivereis. 20Naquele dia sabereis que eu estou no meu Pai e vós em mim e eu em vós. 21Quem acolheu os meus mandamentos e os observa, esse me ama. Ora, quem me ama, será amado por meu Pai, e eu o amarei e me manifestarei a ele. Palavra da Salvação.

COMENTÁRIO

O dá início, dentro da primeira parte do Último Discurso de Jesus, à seção trinitária, onde o mesmo tema é aplicado ao Espírito (vv. 15-17), a Jesus (vv.18-22) e ao Pai (vv. 23-24) – o tema de que, se guardarmos os mandamentos, cada personagem divina virá e habitará conosco.

O Quarto Evangelho nos traz formulações muito bonitas referentes à Trindade e ao Espírito Santo, especialmente no Último Discurso de Jesus.  Neste trecho, se enfatiza a necessidade de guardar os mandamentos, para que possamos receber o dom do Espírito Santo.  Aqui encontramos a primeira de duas promessas no capítulo da chegada do Paráclito, uma palavra grega que significava o que seria, em nossa linguagem, o advogado da defesa.  Em diversos textos João expressa a função do Espírito dentro da comunidade pós-ressurrecional.  Aqui o Espírito agirá como defensor dos discípulos diante dos ataques do mundo de incredulidade (lembremos, que na época do escrito, pelo fim do primeiro século da nossa era, a comunidade joanina estava sofrendo muitos ataques de diversas origens). Vale a pena notar aqui que o Espírito Santo será “outro Paráclito” pois Jesus já tinha sido defensor dos discípulos durante a sua vida terrestre, e continuará a sê-lo no céu.   O Espírito Santo será o espírito da Verdade, ou seja, o Espírito que revelará ao mundo a verdade sobre Jesus, como Jesus já tinha feito, mostrando-nos a verdade sobre o Pai.

A partir do v. 18, como fez no início do capítulo 14, Jesus volta a consolar os seus discípulos, e a falar da sua volta.  Só que aqui não se refere tanto à sua vinda na Parusia, ou a Segunda Vinda, mas uma volta espiritual, através de inhabitação divina em cada discípulo, uma presença real que fará com que os discípulos compreendam que Jesus e o Pai são um. Assim os discípulos conhecerão a relação verdadeira entre Jesus e o Pai, e descobrirão que existe o mesmo relacionamento entre Jesus e eles próprios. De novo põe-se a observância dos mandamentos como precondição para que aconteça essa presença, espiritual, mas real. A observância dos mandamentos não é uma simples exigência legal, mas a demonstração do amor dos discípulos para Jesus. 

Atrás desse texto está o desejo do autor de fortalecer a fé da sua comunidade em tempos difíceis.  Assim tem muita relevância para a Igreja, a comunidade dos discípulos hoje.  Como então, às vezes a nossa fé poderá vacilar diante de ataques, da perseguição ou até da indiferença do mundo.  O texto procura renovar nos leitores a certeza da presença da Trindade no nosso meio – pois o Espírito nos dará força para que vençamos as dificuldades e sofrimentos que eventualmente poderão nos assolar, individual ou comunitariamente.  Também insiste na necessidade de criarmos uma comunidade de amor e solidariedade, para que a inhabitação divina em cada pessoa e na comunidade possa tornar-se uma força efetiva no fortalecimento da nossa fé, da nossa caminhada.  Lembremo-nos que no Quarto Evangelho o Grande Mandamento era de amar-nos una aos outros, como ele nos amou, ou seja, na doação de nós mesmos na luta de criar um mundo onde se vive o sonho de Jesus, que veio “para que todos tenham a vida e vida em abundância”(Jo 10,10).

5° Domingo da Páscoa - Ano A

Refletindo o Evangelho do Domingo

Pe. Thomaz Hughes, SVD

QUINTO DOMINGO DA PÁSCOA - Ano A



Jo 14, 1-12

“Credes em Deus; crede também em mim”

Oração do dia

Ó Deus, Pai de bondade, que nos redimistes e adotastes como filhos e filhas, concedei aos que crêem em Cristo a liberdade verdadeira e a herança eterna. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, Vosso Filho, na unidade do Espírito Santo.

Evangelho - Jo 14,1-12
+ Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo João 14,1-12
Naquele tempo, disse Jesus a seus discípulos: 14,1'Não se perturbe o vosso coração. Tendes fé em Deus, tende fé em mim também. 2Na casa de meu Pai há muitas moradas. Se assim não fosse, eu vos teria dito. Vou preparar um lugar para vós, 3e quando eu tiver ido preparar-vos um lugar, voltarei e vos levarei comigo, a fim de que onde eu estiver estejais também vós. 4E para onde eu vou, vós conheceis o caminho.' 5Tomé disse a Jesus: 'Senhor, nós não sabemos para onde vais. Como podemos conhecer o caminho?' 6Jesus respondeu: 'Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida. Ninguém vai ao Pai senão por mim. 7Se vós me conhecêsseis, conheceríeis também o meu Pai. E desde agora o conheceis e o vistes.' 8Disse Felipe: 'Senhor, mostra-nos o Pai, isso nos basta!' 9Jesus respondeu: 'Ha tanto tempo estou convosco, e não me conheces, Felipe? Quem me viu, viu o Pai. Como é que tu dizes: `Mostra-nos o Pai'? 10Não acreditas que eu estou no Pai e o Pai está em mim? As palavras que eu vos digo, não as digo por mim mesmo, mas é o Pai, que, permanecendo em mim, realiza as suas obras. 11Acreditai-me: eu estou no Pai e o Pai está em mim. Acreditai, ao menos, por causa destas mesmas obras. 12Em verdade, em verdade vos digo, quem acredita em mim fará as obras que eu faço, e fará ainda maiores do que estas. Pois eu vou para o Pai. Palavra da Salvação.


COMENTÁRIO


O Evangelho de João inicia o tal chamado Último Discurso de Jesus, com o texto de hoje.  Esses versículos – a primeira das três partes do discurso – contém a maioria das referências à partida iminente de Jesus; portanto é o trecho mais apropriado para o contexto da Última Ceia.  A moldura do texto consiste em dois mandamentos fortes para acreditar em Deus e em Jesus (vv 1.11).  Novamente, cumpre lembrar que “crer“ não é somente um exercício mental, mas um compromisso de vida – uma atitude vivencial de seguimento de Jesus, no cumprimento da vontade do Pai.

O primeiro tema do texto nasce da insegurança dos discípulos diante da partida iminente de Jesus e a perspectiva de serem entregues à sua própria sorte em um mundo hostil, o que ameaça a sua fidelidade e perseverança (cf. 14,27 e 16, 6.20).  Jesus demonstra que a sua partida não é um abandono, mas o inicio de uma união mais profunda com ele e com o Pai, e que o Espírito Santo os defenderá contra as pressões do mundo incrédulo. Eles têm que alcançar uma fé concreta e firme em Jesus, o Filho encarnado, em que se manifesta a revelação suprema de Deus (cf. 5,38; 8,46-47).  Jesus os reconforta com a promessa de uma volta sua, quando ele os reunirá a ele.  Aqui parece ter uma referência à parusia, a segunda vinda de Jesus, uma das poucas referências em João à chamada “escatologia final”.  Mas é importante que não se limite este retorno de Jesus aos últimos tempos – pois os verbos em v. 3 estão no futuro e no presente!  Assim o texto enfatiza a presença de Jesus na sua comunidade, a Igreja.   De uma certa maneira, onde se vive a verdadeira comunidade do discipulado, o que pertence ao futuro escatalógico já acontece.

Tomé mostra que ele entende tão pouco de Jesus quanto os judeus.  Jesus explica que ele é o caminho ao Pai, pois ele encarna a verdade sobre o Pai e dá a vida que vem do Pai aos seres humanos.  Ele é a única fonte de conhecimento sobre o Pai. Para chegar ao Pai é necessário um seguimento de Jesus mesmo.  Ele não é somente um guia no caminho, mas a fonte da vida e da verdade.  As palavras de Jesus enfatizam a sua unidade total com o Pai – ele o revela e nem as suas palavras nem as suas obras são dele mesmo, mas nascem da sua unidade com o Pai.  Àqueles que crêem será dado o dom de manifestar obras semelhantes e até maiores do que do Filho. Não se trata de fenômenos assombrosos (tão queridos de muitos grupos fundamentalistas hoje), mas do testemunho dos discípulos, animados pela presença do Espírito, para que o mundo creia em Jesus.  A maior obra será a criação de uma comunidade alternativa de amor e justiça – a Igreja – fiel ao seguimento radical de Jesus.  Estes versículos nos convidam a um profundo exame de consciência sobre a nossa maneira de vivenciar a Igreja – tantas vezes simplesmente uma conglomeração de pessoas, sem partilha, sem solidariedade, sem testemunho profético diante do mundo de classes, de consumismo, de materialismo.  Enfatiza a necessidade de recuperarmos a base mística da nossa fé, o seu fundamento.  Sem esta intimidade com Jesus, o Caminho, a Verdade e a Vida, as Igrejas facilmente tornam-se grupos unidos por uma crença, uma lei, uma ética, mas não por uma experiência profunda do Deus da vida, manifestado em Jesus Cristo.  Para que isso aconteça, o texto enfatiza a necessidade da oração em nome de Jesus, que vai atender a nossa prece (somente em João é Jesus que nos atende – normalmente os Evangelhos é o Pai que nos atende através da intercessão de Jesus).

O texto vai continuar com uma reflexão trinitária, onde o mesmo tema é aplicado ao Espírito (vv. 15-17), a Jesus (vv. 18-22) e ao Pai (vv. 23-24) – o tema é de que a pessoa divina virá e habitará em nós, se obedecermos aos mandamentos.

O texto nasceu na comunidade do Discípulo Amado, em uma época de incertezas e dúvidas.  Hoje em dia a nossa Igreja passa por muitas incertezas, duvidas e até às vezes parece balançar.  Diante dos questionamentos (até benéficos, na verdade), dúvidas e porque não, escândalos, que freqüentemente nos abalam, vale a mensagem central do texto, a certeza da presença de Jesus Ressuscitado entre nós, Ele que é o Caminho, a Verdade e a Vida.

4° Domingo da Páscoa - Ano A



Refletindo o Evangelho do Domingo

Pe. Thomaz Hughes, SVD

QUARTO DOMINGO DA PÁSCOA - Ano A



Jo 10, 1-10.

“Eu vim para que todos tenham a vida e a tenham em abundância”



Oração do dia
Deus eterno e todo-poderoso, conduzi-nos à comunhão das alegrias celestes, para que o rebanho possa atingir, apesar de sua fraqueza, a fortaleza do Pastor. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, Vosso Filho, na unidade do Espírito Santo.

Evangelho - Jo 10,1-10

+ Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo João 10,1-10
Naquele tempo, disse Jesus: 10,1'Em verdade, em verdade vos digo, quem não entra no redil das ovelhas pela porta, mas sobe por outro lugar, é ladrão e assaltante. 2Quem entra pela porta é o pastor das ovelhas. 3A esse o porteiro abre, e as ovelhas escutam a sua voz; ele chama as ovelhas pelo nome e as conduz para fora. 4E, depois de fazer sair todas as que são suas, caminha à sua frente, e as ovelhas o seguem, porque conhecem a sua voz. 5Mas não seguem um estranho, antes fogem dele,  porque não conhecem a voz dos estranhos.' 6Jesus contou-lhes esta parábola, mas eles não entenderam o que ele queria dizer. 7Então Jesus continuou: 'Em verdade, em verdade vos digo, eu sou a porta das ovelhas. 8Todos aqueles que vieram antes de mim são ladrões e assaltantes, mas as ovelhas não os escutaram. 9Eu sou a porta. Quem entrar por mim, será salvo; entrará e sairá e encontrará pastagem. 10O ladrão só vem para roubar, matar e destruir. Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância. Palavra da Salvação.

COMENTÁRIO


O texto de hoje manifesta claramente o ambiente pastoril da Palestina no tempo de Jesus.  Os versículos estão carregados de imagens tiradas da vida dos pastores, nas montanhas de Judéia, imagens rurais que talvez sejam difíceis de serem bem compreendidas no ambiente urbano de hoje.  Porém, a mensagem básica permanece clara, e é de valor perene.

Podemos dividir o texto em duas grandes partes. Versículos 1-5 e vv 6-10. Alguns exegetas acham duas parábolas separadas nos vv. 1-5: os primeiros três versículos fazem contraste entre duas maneiras de se aproximar às ovelhas.  Quem não entra pela porta é maléfico.  Os vv. 3b-5 têm como enfoque o relacionamento entre a ovelha e o pastor.  Elas só respondem à voz do seu verdadeiro pastor.  No contexto do Evangelho, fica claro que aqui se contém uma advertência contra o perigo de responder aos ensinamentos dos fariseus, que João apresenta como falsos mestres.  Podemos atualizar essa advertência para os dias de hoje!

Ë claro que também aqui temos ecos do Capítulo 34 de Ezequiel, que castigava os lideres do povo de Israel como maus pastores, que engordavam as custas do povo.  Assim as ovelhas estavam dispersas como ovelhas sem pastor (Ez 34, 1-10).  Nesse capítulo, o Senhor promete que vai reunir as suas ovelhas dispersas, e conduzi-las às boas pastagens (34,11-16).  O nosso texto faz compreender que Jesus é o instrumento desta missão de Javé, pois é ele o verdadeiro Bom Pastor.

A segunda parte, 10, 7-10, usa as metáforas da porta e do bom pastor.  Jesus é a porta do aprisco, e também o bom pastor.  João quer insistir que Jesus é a única fonte de salvação.  Os que vieram antes dele, provavelmente uma referência aos mestres judaicos e às suas tradições, são rejeitados. É Jesus que veio para que todos tivessem a vida plena.

Aqui é necessário insistir que a missão de Jesus era trazer a vida para todos – não para alguns – e a vida plena, não uma suposta “vida espiritual”.  Vida plena, em abundância, exige tanto os bens materiais necessários para uma vida digna, como os bens espirituais.  Assim, o seguimento do Bom Pastor, nos coloca em choque com a sociedade vigente que restringe a vida plena a alguns privilegiados, enquanto exclui a maioria da humanidade.  O texto impede que nós nos refugiemos numa interpretação espiritualista, oferecendo uma vida plena após a morte, pois o Reino de Deus que Jesus anuncia já está no meio de nós (cf Mc 1, 14-15), mesmo que a sua realização plena só acontece no além.  O v. 11 nos manifesta o preço a ser pago por ser bom pastor!  Jesus afirma que "o bom pastor se despoja da própria vida por suas ovelhas” (v.11).  Enquanto o mercenário sacrifica as suas ovelhas ao seu interesse, o bom pastor entrega a sua vida até a morte para que os outros vivam.

As imagens do texto são por demais conhecidas.  Todos conhecemos cartazes mostrando Jesus como o Bom Pastor.  Cumpre assumir a continuidade da sua missão, entregando a nossa vida na luta diária para a criação de uma sociedade mais justa e humana – portanto divina – pois só assim seremos fiéis a aquele que veio “para que todos tenham a vida e a tenham em abundância”.


3° Domingo da Páscoa - Ano A


Refletindo o Evangelho do Domingo

Pe. Thomaz Hughes, SVD

TERCEIRO DOMINGO DA PÁSCOA - Ano A


Lc 24, 13-35


“Reconheceram Jesus quando ele repartiu o pão”


Oração do dia
Ó Deus, que o vosso povo sempre exulte pela sua renovação espiritual, para que, tendo recuperado agora com alegria a condição de filhos de Deus, espere com plena confiança o dia da ressurreição. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, Vosso Filho, na unidade do Espírito Santo.

Evangelho - Lc 24,13-35
+ Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo Lucas

24,13Naquele mesmo dia, o primeiro da semana, dois dos discípulos de Jesus iam para um povoado, chamado Emaús, distante onze quilômetros de Jerusalém. 14Conversavam sobre todas as coisas que tinham  acontecido. 15Enquanto conversavam e discutiam, o próprio Jesus se aproximou e começou a caminhar com eles. 16Os discípulos, porém, estavam como que cegos, e não o reconheceram. 17Então Jesus perguntou: 'O que ides conversando pelo caminho?' Eles pararam, com o rosto triste, 18e um deles, chamado Cléofas, lhe disse: 'Tu és o único peregrino em Jerusalém que não sabe o que lá aconteceu nestes últimos dias?' 19Ele perguntou: 'O que foi?' Os discípulos responderam: 'O que aconteceu com Jesus, o Nazareno, que foi um profeta poderoso em obras e palavras, diante de Deus e diante de todo o povo. 20Nossos sumos sacerdotes e nossos chefes o entregaram para ser condenado à morte e o  crucificaram. 21Nós esperávamos que ele fosse libertar Israel, mas, apesar de tudo isso, já faz três dias que todas essas coisas aconteceram! 22É verdade que algumas mulheres do nosso grupo nos deram um susto. Elas foram de madrugada ao túmulo 23e não encontraram o corpo dele. Então voltaram, dizendo que tinham visto anjos e que estes afirmaram que Jesus está vivo. 24Alguns dos nossos foram ao túmulo e encontraram as coisas como as mulheres tinham dito. A ele, porém, ninguém o viu.' 25Então Jesus lhes disse: 'Como sois sem inteligência e lentos para crer em tudo o que os profetas falaram! 26Será que o Cristo não devia sofrer tudo isso para entrar na sua glória?' 27E, começando por Moisés e passando pelos Profetas, explicava aos discípulos todas as passagens da Escritura que falavam a respeito dele. 28Quando chegaram perto do povoado para onde iam, Jesus fez de conta que ia mais adiante. 29Eles, porém, insistiram com Jesus, dizendo: 'Fica conosco, pois já é tarde e a noite vem chegando!' Jesus entrou para ficar com eles. 30Quando se sentou à mesa com eles, tomou o pão, abençoou-o, partiu-o e lhes distribuía. 31Nisso os olhos dos discípulos se abriram e eles reconheceram Jesus. Jesus, porém, desapareceu da frente deles. 32Então um disse ao outro: 'Não estava ardendo o nosso coração quando ele nos falava pelo caminho, e nos explicava as Escrituras?' 33Naquela mesma hora, eles se levantaram e voltaram para Jerusalém onde encontraram os Onze reunidos com os outros. 34E estes confirmaram: 'Realmente, o Senhor ressuscitou e apareceu a Simão!' 35Então os dois contaram o que tinha acontecido no caminho, e como tinham reconhecido Jesus ao partir o pão. Palavra da Salvação.

COMENTÁRIO
Talvez um dos relatos mais conhecidos de Lucas seja a história dos dois discípulos na estrada de Emaús.  Aqui temos o retrato das comunidades lucanas pelo ano 85 - vacilando na fé, descrentes, desanimadas, sem sentir a presença do Ressuscitado.  Lucas procura reanimar o seu pessoal, mostrando que eles não estão abandonados - muito pelo contrário, estão caminhando contando com a presença do Senhor que venceu a morte.

Esta história pode nos ajudar bastante hoje, pois nos indica como devemos usar a Bíblia para animar a nossa caminhada.  Jesus é o mestre da Bíblia, e aqui ele ensina como aproveitar a Escritura para iluminar os problemas práticas da nossa caminhada, e nos dar coragem na nossa missão de evangelizadores.

O que temos aqui é realmente um pequeno drama em cinco atos - um drama que nos mostra a pedagogia de Jesus.  Vejamos mais de perto:



O Primeiro ato: vv. 13 -19a:“Introdução



O relato começa com as palavras “nesse mesmo dia”.  Devemos já fazer uma parada e nos perguntar “que dia”?  Para nós seria o dia da Ressurreição, mas para os dois discípulos era simplesmente o terceiro dia da morte de Jesus!  Dia de desânimo, de tristeza. “Os dois iam para um povoado chamado Emaús, distante onze quilômetros de Jerusalém”.  Aqui é bom lembrar que o bom judeu não podia caminhar mais do que um quilômetro no dia de sábado.  Portanto, era impossível que eles viajassem no dia anterior.  Domingo é a sua primeira oportunidade para sair de Jerusalém, e aproveitaram bem - já estão voltando para a sua casa.  A cena começa com a desintegração da comunidade cristã.  Tudo acabou, a comunidade se dispersa, não há nem alegria nem esperança.

Quem eram eles?  Sabemos do relato que um se chamava Cléofas!  E o outro?  O Evangelho de João nos conta que a irmã de Maria, mãe do Senhor, chamada Maria de Cléofas, estava junto à cruz (Jo 19,25).  Não seria demais acreditar que os dois discípulos fossem um casal, Cléofas e a sua esposa, voltando depois da peregrinação pascal à Jerusalém.  Nunca saberemos com certeza, mas é uma hipótese agradável e possível. Pois, sendo assim, a descoberta da presença do Ressuscitado dar-se-á no lar e não em uma hospedaria anônima.  Seria bem de acordo com a valorização na obra de Lucas da Igreja Doméstica, a Igreja que se reuniu nas casas, como fazem tantas Igrejas vivas de hoje

De repente, no caminho surge Jesus, sem que seja reconhecido.  Com isso, Lucas quer dizer que o Ressuscitado não é um defunto que voltou a viver - tem uma nova maneira de ser, um corpo glorificado.  É importante notar como Jesus se comporta, através dos verbos que Lucas usa.  Ele “aproximou-se”, “caminhou com eles” e “perguntou”.  Ele não veio “dando de dedo”, nem dando explicações bíblicas.  Ele criou um ambiente de fraternidade onde fosse possível explicar tanto a vida como a Bíblia!  Quantas vezes isso falta em nossos grupos, nossas comunidades - não nos aproximamos uns aos outros, mantemos distância!  Não caminhamos juntos, queremos dar soluções sem conhecer a realidade dos nossos irmãos e irmãs!  E por isso mesmo, muitas vezes não têm efeito as nossas reuniões, os nossos encontros bíblicos.

O “ato” termina com a pergunta dele: “O que é que vocês andam discutindo pelo caminho” (v.17), ou seja, ele dá uma oportunidade para que eles exponham a sua realidade, sem julgamento, sem moralismo. Ele parte da realidade dos dois.



Segundo Ato: vv 19b -24: “Os Discípulos Falam”



Diante da oportunidade de explicitar a sua realidade, Cléofas não titubeia.  Ele expõe com clareza a sua situação.  Diante da morte de Jesus ele frisa uma coisa importante: “nós esperávamos que ele fosse o libertador de Israel” (v. 21)  Eles “esperavam”, portanto não esperam mais nada.  Aqui ressoam traços de decepção, desilusão, desânimo, até duma certa revolta contra Jesus, pois todas as suas esperanças tinham sido desfeitas.  Os seus sentimentos vão muito além de uma simples tristeza!

É importante notar também que Lucas explicita bem quem foi quem matou Jesus - não foi o povo, foram grupos de interesse bem definidos: “Nossos chefes dos sacerdotes e nossos chefes o entregaram para ser condenado à morte, e o crucificaram” (v.20).  Para não reduzir a morte de Jesus a uma fatalidade qualquer, ou a algo desejado pelo Pai, é mister examinar mais profundamente esta afirmação do Cléofas.  Jesus foi morto, assassinado judicialmente pelos “chefes dos sacerdotes” - um grupo de sacerdotes do partido aristocrático e conservador dos saduceus, que dominava o comércio do Templo, lucrando muito com a exploração do povo através da religião, e que viu a sua hegemonia ameaçada pela pregação e profetismo de Jesus. Também foi morto pelos “chefes” ou “magistrados”, ou seja, os membros do sinédrio, o órgão do governo interno do povo judaico de Palestina, na maioria pertencentes ao partido elitista dos saduceus (não dos fariseus),  e colaboradores com o poder romano, lucrando bastante com isso.  Então Jesus foi morto não por acaso, mas para defender os privilégios da elite dominante!  A cruz era a conseqüência lógica da vida de Jesus!

Outro elemento importante é o fato de que os dois sabiam do túmulo vazio - dois dos apóstolos já tinham verificado a história das mulheres.  Mas isso não dizia nada para eles!  Aqui se destaca que a nossa fé não se baseia num túmulo vazio!  É a nossa fé na Ressurreição que explica porque o túmulo estava vazio, e não o túmulo que dá consistência à nossa fé!



Terceiro Ato: vv25-27: A Bíblia



Agora, e só agora, depois de ter criado o ambiente e escutado a realidade, é que Jesus usa a Escritura.  Ele frisa que eles “custam para entender e demoram para acreditar em tudo o que os   profetas falaram”( v. 25).  Notemos bem - não custaram para “saber”, mas para “entender e acreditar”.  Pois eram judeus piedosos, que, mesmo sendo analfabetos, conheciam de cor os salmos e as profecias.  O seu problema era que, embora conhecessem o livro da Bíblia, e também o livro da vida, eles não conseguiam ligar as duas coisas.  Então Jesus “explica” as escrituras - isso é, ele não da uma aula de exegese, mas faz a ligação entre a vida deles e a Bíblia, iluminando a sua realidade com a Palavra de Deus!



Quarto Ato: vv 28-32: A Partilha


Chegando em Emaús, os discípulos convidam Jesus para entrar a e jantar com eles.  Se realmente se trata de um casal, então seria entrar na sua casa, no aconchego do seu lar, e não em uma hospedaria, como normalmente a gente supõe.  E aqui temos o ponto central da história - pois até agora a explicação bíblica, por tão bonita que pudesse ter sido, não mudou a vida deles.  Mas agora sim.  Jesus se põe à mesa e: “tomou o pão e abençoou, depois o partiu e deu a eles” (v.30).  De propósito, Lucas usa as palavras que recordam a Última Ceia.  É a experiência da partilha, da comunidade!  Agora o milagre acontece: “Nisso os olhos dos discípulos se abriram e eles reconheceram Jesus” (v.31) .

Neste mesmo momento, Jesus desaparece da frente deles!  Porque?  Porque, uma vez feita a experiência da presença do Ressuscitado no meio deles, eles não precisavam mais da “muleta” da sua presença física.

       E agora eles caiem dentro de si e reconhecem que: “Não estava o nosso coração ardendo quando ele nos falava pelo caminho, e nos explicava as Escrituras?” (v.32)A Bíblia é capaz de fazer “arder o coração”, mas para “abrir os olhos” é necessário a experiência de comunidade, de celebração , de partilha!



Quinto Ato: vv 33-36: A Missão



Se a história terminasse aqui, seria a história de uma experiência bonita feita por duas pessoas.  Isso não basta.  Tal experiência da presença do Senhor Ressuscitado exige a formação de uma comunidade fraterna de vida e missão.  Os mesmos dois que de manhã fugiam de Jerusalém, pois era o lugar da morte, da perseguição e do fracasso, de tarde se põem no caminho de volta! O que mudou em Jerusalém durante o dia? Nada!  Continua sendo o lugar de perigo, de morte, de perseguição.  Mas mudou a cabeça dos dois.  Em lugar de uma fé pré-pascal, eles agora têm uma fé pós-pascal.  Em lugar de desânimo, há entusiasmo e coragem, pois experimentaram a presença de Jesus Ressuscitado. E a história que começou com a comunidade se desintegrando, termina com a comunidade se reintegrando, se unindo, na paz e na alegria, pois puderam confirmar: “Realmente o Senhor ressuscitou, e apareceu a Simão”( v. 34)E os dois de Emaús puderam contar: “O que tinha acontecido no caminho, e como tinham reconhecido Jesus quando ele partiu o pão” (v.36).

Esta história pode servir para nós como paradigma de um círculo bíblico, grupo de reflexão, ou seja qual for o nome que nós damos às nossas pequenas comunidades.  Jesus liga quatro elementos essenciais - a realidade, a Bíblia, a celebração partilhada e a comunidade.  É na união entre estes elementos que se revela a presença do Ressuscitado e a vontade de Deus.  É na interação destes aspectos da vida cristã que a Bíblia se torna: “Lâmpada para os meus pés, e luz para o meu caminho” (Sl 119.105).  Procuremos unir estes elementos nas nossas reuniões e encontros, e descobriremos como se concretiza o desejo do Salmista: “Oxalá vocês escutem hoje o que Ele diz” (Sl 95,7).


2° Domingo da Páscoa - Ano A

Refletindo o Evangelho do Domingo

Pe. Thomaz Hughes, SVD


SEGUNDO DOMINGO DA PÁSCOA - Ano A


Jo 20, 19-31

“A Paz Esteja Com Vocês”

Oração do dia
Ó Deus de eterna misericórdia, que reacendeis a fé do vosso povo na renovação da festa pascal, aumentai a graça que nos destes. E fazei que compreendamos melhor o batismo que nos lavou, o espírito que nos deu nova vida e o sangue que nos redimiu. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, Vosso Filho, na unidade do Espírito Santo.

Evangelho - Jo 20,19-31

+ Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo João.
20,19Ao anoitecer daquele dia, o primeiro da semana, estando fechadas, por medo dos judeus, as portas do lugar onde os discípulos se encontravam, Jesus entrou e pondo-se no meio deles, disse: 'A paz esteja convosco'. 20Depois destas palavras, mostrou-lhes as mãos e o lado. Então os discípulos se alegraram por verem o Senhor. 21Novamente, Jesus disse: 'A paz esteja convosco. Como o Pai me enviou, também eu vos envio'. 22E depois de ter dito isto, soprou sobre eles e disse: 'Recebei o Espírito Santo. 23A quem perdoardes os pecados  eles lhes serão perdoados; a quem os não perdoardes, eles lhes serão retidos'. 
        24Tomé, chamado Dídimo, que era um dos doze, não estava com eles quando Jesus veio. 25Os outros discípulos contaram-lhe depois: 'Vimos o Senhor!'. Mas Tomé disse-lhes: 'Se eu não vir a marca dos pregos em suas mãos, se eu não puser o dedo nas marcas dos pregos e não puser a mão no seu lado, não acreditarei'. 26Oito dias depois, encontravam-se os discípulos novamente reunidos em casa, e Tomé estava com eles. Estando fechadas as portas, Jesus entrou, pôs-se no meio deles e disse: 'A paz esteja convosco'. 27Depois disse a Tomé: 'Põe o teu dedo aqui e olha as minhas mãos. Estende a tua mão e coloca-a no meu lado. E não sejas incrédulo, mas fiel'. 28Tomé respondeu: 'Meu Senhor e meu Deus!' 29Jesus lhe disse: 'Acreditaste, porque me viste? Bem-aventurados os que creram sem terem visto!' 30Jesus realizou muitos outros sinais diante dos discípulos, que não estão escritos neste livro. 31Mas estes foram escritos para que acrediteis que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais a vida em seu nome. Palavra da Salvação.


COMENTÁRIO


No texto anterior ao de hoje, a Maria Madalena traz a notícia da Ressurreição aos discípulos incrédulos.  Agora é o próprio Jesus que aparece a eles.  Não há reprovação nem queixa nas suas palavras, apesar da infidelidade de todos eles, mas somente a alegria e a paz que já tinha prometido no ultimo discurso.  Duas vezes Jesus proclama o seu desejo para a comunidade dos seus discípulos – “A paz esteja com vocês”.  O nosso termo “paz” procura traduzir – embora de uma maneira inadequada – o termo hebraico “Shalom!”, que é muito mais do que “paz” conforme o nosso mundo a compreende.  O “Shalom” é a paz que vem da presença de Deus, da justiça do Reino.  O SHALOM pode ser definido como “o bem-estar total para todos/as” - é tudo que Deus deseja para os seus filhos e filhas. Não pode existir sem fraternidade, solidariedade e justiça social em todos os níveis.  Jesus não promete a paz do comodismo, mas, pelo contrário, envia os seus discípulos na missão árdua em favor do Reino, mas promete o shalôm, pois ele nunca abandonará quem procura viver na fidelidade ao projeto de Deus.
Jesus soprou sobre os discípulos, como Deus fez (é o mesmo termo) sobre Adão, quando infundiu nele o espírito de vida.  Jesus os recria com o Espírito Santo.
Normalmente imaginamos o Espírito Santo descendo sobre os discípulos nos eventos de Pentecostes, mas aquilo na Escritura era a descida oficial e pública do Espírito para dirigir a missão da Igreja no mundo.   Para João, o dom do Espírito, que da sua natureza é invisível, flui da glorificação de Jesus, da sua volta ao Pai.  O dom do Espírito neste texto tem a ver com o perdão dos pecados.
Mais uma vez, num domingo, Jesus aparece aos discípulos (notem a ênfase sobre o Domingo – duas vezes).  Esta vez, Tomé está presente.  Ele representa os discípulos da comunidade joanina do fim do século primeiro, que estavam vacilando na sua fé na Ressuscitado, diante dos sofrimentos e tribulações da vida.  E assim nos representa, quando nós vacilamos e duvidamos. Jesus nos fortalece com as palavras “Felizes os que acreditaram sem ter visto!”. Assim muitas vezes será a realidade da nossa fé – acreditar contra todas as aparências que o bem é mais forte do que o mal, a vida do que a morte!  Somente uma fé profunda e uma experiência da presença do Ressuscitado vai nos dar essa firmeza.
Tomé confessa Jesus nas palavras que o Salmista usa para Javé (Sl 35,23).  No primeiro capítulo do Evangelho de João (cf Jo 1, 29.34.36.38.41.45.49.51), os discípulos deram a Jesus uma série de títulos que indicaram um conhecimento crescente de quem ele era; aqui Tomé lhe dá o título final e definitivo – Jesus é Senhor e Deus!
Nessa proclamação triunfante da divindade de Jesus, o evangelho original terminava. (O Capítulo 21 é um epílogo, adicionado mais tarde).  No início, João nos informou que “o Verbo era Deus”.  Agora ele repete essa afirmação e abençoa todos os que a aceita baseados na fé!  A meta do Evangelho foi alcançada – mostrar a divindade de Jesus, o Verbo que se fez carne e habitou entre nós, para que, acreditando, todos pudessem ter a vida nele.